domingo, 21 de agosto de 2011

O Analista de Bagé e o TAB



Visitando o blog Chá de Hortelã, da Liliana, encontrei um post interessante sobre TAB e ganho de peso. Mas o que me chamou a atenção de verdade foram os comentários. Reproduzi aqui 5 deles. Com qual objetivo? O de entendermos por que há bipolares não-diagnosticados, tema que não era, nem de longe, o do post em Chá de Hortelã...

O primeiro comentário (o do anônimo de Vacaria) nos dá uma ideia do motivo pelo qual muitos bipolares não são diagnosticados, levam muitos anos até que o sejam ou, pior, falecem antes que recebam diagnóstico e tratamento.

Os outros 4 comentários (escritos por bipolares) são respostas ao anônimo de Vacaria. (Nada contra a cidade, obviamente! Que isto fiquem bem claro. Eu o chamaria pelo nome, mas ele não se identificou, limitando-se a mencionar a cidade onde vivia sua mãe e parentela. Ele pode não viver aí, mas foi Vacaria que ficou na mente dos bipolares que leram seu comentário...)


Anônimo de Vacaria disse:
É interessante essa história de bipolar. Os psiquiatras não tem mais nada pra fazer e ficam inventando doença pras criatura[s] ficar[em] dizendo: "Ai, eu sou bipolar" ou "O meu filho é hiperativo".

Como que antes não existia nada disso? As pessoas são muito sujeitas ao que se dizem muitas vezes, daí acabam com os sintomas descritos mesmo não tendo nada.

Quando minha mãe vivia na fazenda da minha vó lá em Vacaria, interior do RS, não existia nada disso e ela e todos os seus 9 irmãos tão aí bem fortes.


Refúgio Poético disse:
Que bom que lá em Vacaria todos da sua familia estão bem fortes e com saúde e nenhum tentou o suicídio e conseguiu sua finalidade por ser bipolar. Seria um marco, um trauma para todos não tenha dúvida disso.

Eu sou bipolar tenho uma filha de 18 anos e nós duas sofremos muito com isso, me trato com psiquiatra que não tem mais nada o que fazer somente para não cometer suicídio e minha filha que não mora em Vacaria ter uma mãe.

Vontade de viver não tenho nenhuma porque estou em fase depressiva e tomo remédios que claro você nunca ouviu falar. No seu mundo é tudo frescura. Afinal em Vacaria as pessoa
[s] morrem e nem se sabe o porque.



wellinghton disse:
querida bom dia… pois para mim que escrevo é manha… vc tem transtorno bipolar? vc convive com alquem que tem[?]… acho que nao[,] eu tenho 26 anos de idade[,] venho tentando suicidio des dos nove anos… tenho poucos amigo pois nimquem ten saco para meus altos e baixos.e graças a deus descobri [que sou bipolar.]aos 22 anos[,] depois de ficar preso numa torre de celular por mais de 5 horas sem consiencia apenas preço por meu pé[,] descobri que tenho trastorno bipolar …. assim sei qual sao minhas limitaçoes..e [a]te que medicasao tomar… mais que pena vc nao sabe o que estou dizendo pois acxha que trastorno [bipolar] é doença do futuro e posso te dizer que nao …….pois varios nomes da hi[s]tori[a] tinha[m] trastorno [bipolar]…….. sem falar que sua vidinha deve ser um maximo para ficar criticando a dor do outro… cuidado pois isto tambem é um tipo de trastorno……nao sei o nome centifico mais o popular é falar dos outro para fugir do meu….. deus te abençoe[.]


Daniel disse:
Ignorância tem tratamento também, ok? Basta se informar…
"como antes não existia nada disso…?"
Assim como antes não existia câncer, alcoolismo, hiv, alzheimer.



Andréa S. L disse:
Se vc acha que transtorno bipolar não é uma doença é por que nunca ficou dias sem dormir, pensando que é a rainha de não sei lá o quê e que está cima do bem e do mal, sem falar que quando esta crise passa todos te olham e dizem: – olha lá aquela louca !!! Gostaria de ser lembrada como a louca ? Ou de entrar em uma depressão que não tivesse vontade nem de comer ou tomar um banho ? Acha que isso não é doença ? Então te dou um conselho ! Nunca discurse sobre o que não conhece !!! E desejo que continue na ignorância, porém com respeito a nós bipolares. Por que não desejo a ningué essa doença.

E que bom que lá em Vacaria não existia nada disso. Mas será que ninguém morreu de outra doença não ?!!! Não existe só transtorno bipolar nomundo !!! 

 


Pois bem! O que dizer do anônimo de Vacaria? Creio que já disseram quase tudo acima...
 
Mas eu costumo comentar que ninguém tem um médico ao lado 24 por dia, de modo que, se uma pessoa apresenta sintomas de TAB, os primeiros a notar costumam ser os amigos e parentes. Em poucas palavras, quem costuma encaminhar o bipolar a um profissional da área são pessoas leigas, que não sabem o que está havendo, mas que percebem que algo está errado.
 
Mas imagine agora que todas as pessoas leigas do mundo fossem como o anônimo de Vacaria. Imaginou? Pois é! Ninguém mais encaminharia amigos ou parentes aos profissionais da área, e ninguém mais morreria de TAB, simplesmente porque ninguém mais receberia o diagnóstico de transtorno bipolar... Viveríamos como em Vacaria, onde ao que parece não há bipolares e os psiquiatras não têm o que fazer...
 
Agora, imagine também bipolares não-diagnosticados pensando como o anônimo de Vacaria... Seria bom?

O triste é que muitas pessoas realmente pensam como o anônimo de Vacaria, o que nos ajuda a entender por que os bipolares levam em média 10 anos até que recebam o diagnóstico correto. Há outros números, entretanto, que dizem que essa média fica em 7,5 anos. Seja como for, muita coisa pode acontecer nesse meio-tempo, incluída a possibilidade de óbito, seja através de suicídio, seja através de um acidente, como cair de uma torre de celular...

Ainda sobre o tema deste post, a Ana, no blog Manual do Bipolar, já havia dito: Um dos maiores problemas dos portadores de Bipolaridade é a falta de informação de familiares e amigos e/ou o fato de não saberem interpretar seus sintomas e saberem o que é a doença. O anônimo de Vacaria, infelizmente, ilustra bem o que a Ana diz. Em outras palavras, Desgraça pouca é bobagem... ou Mal, seja bem-vindo se vier só. (O TAB sozinho, sendo perfeitamente tratável, era pouco. Tinha que haver mais; tinha que haver os anônimos de Vacaria para que o TAB fosse um drama realmente digno de nota...)

Ainda assim, o que poderíamos dizer em favor do anônimo de Vacaria? Não me agrada só criticar alguém; há sempre um elogio que podemos fazer... Vejamos. Poderíamos dizer que ele... e também... Pois é! Este é o maior elogio que sou capaz de fazer a ele no momento... Maior elogio que esse, depois de seu comentário no Chá de Hortelã, ficou difícil. Muito difícil.


Moral da história? O Luís Fernando Veríssimo que me perdoe, mas o anônimo de Vacaria me lembrou muito o Analista de Bagé – este mais sensível que aquele, é claro...


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Um comentário:

Thalita disse...

Anônimo de Vacaria, essa é boa!
Entendo bem isso, tenho depressão há anos, o que me levou a ter transtornos alimentares e sei como é difícil ter apoio ou pouco de compreensão que seja. Bipolaridade não é frescura, não tenho(sei lá, será?) entendo quem passa por isso. Conheço muitas pessoas que são borderlines, é bem complicado, e em comum se tem o fato da família não entender e nem procurar saber, mesmo que um médico afirme. tenho depressão há anos, o que me levou a ter transtornos alimentar